domingo, 1 de junho de 2008

A fabulosa Deolinda


Tudo começou na semana passada. Enquanto fazia zapping passei pelo inefável programa do Malato, prontinho para continuar a carregar nos botões do comando. Mas hesitei. Estava a ser anunciado um número musical.
"Ora deixa lá ver... O que será?", pensei.
E de repente... fado!
"Ora bolas!" e inclinei-me em direcção à mesinha, para pegar no comando e continuar a passar canais. No entanto, ainda antes de conseguir mudar o canal, começa a Deolinda a tocar o "Movimento Perpétuo Associativo". Curioso, pousei o comando, ouvi, reparei com alguma atenção e não pude deixar de esgar um sorriso de simpatia no fim.

Ontem, enquanto lia o jornal, pela manhã, tomei conhecimento que a Deolinda dava um concerto no Passos Manuel. "Deve ser giro...", pensei. Reuni um grupinho de vítimas dos meus desvarios musicais, e lá fomos.

Ora, o concerto foi absolutamente notável, em todos os aspectos. Desde o ambiente familiar propiciado pela sala, muito aconchegante, até à decoração kitsch do palco, com rendinhas na munição, um velho lustre pousado e um tapete no chão. Entraram com uma simpatia irradiante e arrabataram a plateia aos primeros acordes.


Na música da Deolinda - que assim gosta de ser chamada, não "os", mas "a" Deolinda - não há guitarra portuguesa e não há tristeza, mas há contrabaixo, António Variações e os Fairground Attraction. Há uma alegria imensurável e um prazer no que se faz que não engana ninguém. A Ana não é uma actriz em palco, é a perfeita encarnação da personagem que cada uma das canções tem. A sua pose e apontamentos vocais, sempre no momento certo, são brilhantes.


Já por diversas diversas vezes aqui escrevi que não gosto de fado. Tenho um enorme respeito pelo Mariza e pelo Camané, mas continuo a achar o fado soturno e demasiado limitado por esterótipos que espartilham o seu desenvolvimento. As tentativas que foram feitas, em tempos, de modernizar o fado penderam todas para o intelectual, como a Mísia, por exemplo, e foram um flop.

Agora, a Deolinda fez mais num disco por aproximar o fado de cépticos como eu do que todos os fadistas quese seguiram ao Marceneiro e à Amália.


De resto, o extraordinário trabalho da Deolinda só vem confirmar uma teoria minha, que também já aqui deixei: a verdadeira música tradicional portuguesa não é o fado, são os viras, os corridinhos e os folclores de aldeia. O fado é uma importação do norte de África, uma música magrebina adaptada e adoptada por Lisboa. O que faz a Deolinda é afastar os elementos "amouriscados" do fado e substituí-los pela alegria de António Variações e, em momentos, o festival vaudeville de Waits ou Kusturica.


No dia em que Paulo Gonzo tocou no Rock in Rio, Obrigado, Deolinda, pela lufada de ar fresco.


1 comentário:

stylife disse...

Tou contigo!
A Deolinda é uma animação em voz;)
Bjs